Na liturgia católica, 6 de agosto é Festa da Transfiguração do Senhor. Por cair num domingo, neste 2006, a Festa transforma-se em Solenidade. Eis-nos, portanto, caríssimos, com Pedro, Tiago e João, ante o Senhor nosso Jesus Cristo, envolvido pela Nuvem luminosa, que o cobre com sua sombra, como cobriu a Virgem Maria na Anunciação; eis o Senhor Jesus totalmente transfigurado, com vestes brilhantes e alvas “como nenhuma lavadeira sobre a terra poderia alvejar”; eis Jesus ladeado por Moisés e Elias... Que significa, caríssimos, este belíssimo Mistério?
Como o Deus Santo de Israel, sobre o Monte Sinai, que revelou sua glória a Moisés e depois a Elias, assim também hoje, no Monte Tabor, Jesus revela a sua glória, a glória de Filho de Deus, a glória divina que é sua, mas que se escondia na sua pobre condição humana por ele assumida para nos salvar: “O Verbo se fez carne e habitou entre nós e nós vimos a sua glória, glória que ele tem junto ao Pai com Filho único, cheio de graça e de verdade” (Jo 1,14). Hoje, caríssimos, o Pai, envolvendo o Filho Amado com a Nuvem, símbolo do Santo Espírito, nos revela antecipadamente a glória que Jesus, na sua natureza humana igual à nossa, teria depois da Ressurreição: “Efetivamente, ele recebeu honra e glória da parte de Deus Pai, quando do seio da esplêndida glória se fez ouvir aquela voz que dizia: ‘Este é o meu Filho bem-amado, no qual ponho o meu bem-querer’”. Olhemos para Jesus: ele é divino, ele é o Filho amado, igual ao Pai em glória; ele é o nosso Deus Salvador! Se Moisés e Elias sobre o Monte não puderam ver o Rosto de Deus, agora, no Tabor, eles contemplam, com o rosto descoberto, a glória fulgurante de Deus que se manifesta na Face de Cristo! Eis, meus caros irmãos: em Cristo, Deus se revelou a nós, em Cristo, Deus veio ao nosso encontro. Ele se fez um de nós, assumiu nossa pobreza humana, para nos enriquecer com a glória da sua divindade. E essa glória, ele no-la mostra hoje sobre o Tabor; essa glória é o nosso destino, é a nossa herença!
Mas, atenção! Nos três evangelhos que narram a Transfiguração, está dito que esta manifestação gloriosa do Senhor aconteceu pouco depois do primeiro anúncio da sua Paixão. O que isso quer dizer? Duas coisas importantíssimas: Primeiro, que a Paixão não é um fim, a Paixão não é derrota, mas o modo que Deus tem de vencer; a Paixão é caminho para a glória. E aqui, precisamente, a segunda lição: não se pode entrar na glória de Cristo sem passar pela cruz do Senhor; como dizia São João da Cruz: “Quem não ama a cruz de Cristo, não verá a glória de Cristo!” Não é por acaso que Jesus proíbe os discípulos de contar o que eles viram sobre o Monte“até que o Filho do Homem tivesse ressuscitado dos mortos”. É que jamais se poderá compreender a glória de Cristo sem antes se ter participado do mistério de sua cruz. Uma glória sem a experiência da cruz seria triunfalista, anti-evangélica, idolátrica, mundana. Somente a glória que brota do amor da cruz é divina, libertadora, humanizadora, reveladora do coração do Pai! Não é por acaso também que Pedro, Tiago e João, que estiveram com Jesus no Tabor, deverão também estar com ele no Monte das Oliverias, convidados a fazer-lhe companhia no momento em que ele “começou a apavorar-se e a angustiar-se” (Mc 14,33). Infelizmente, aqueles lá - como nós tantas vezes -, no Tabor queriam armar tendas e fica ali; nas Oliveiras dormiram e deixaram Jesus sozinho...
Eis, caríssimos, o sentido do Mistério de hoje! Cristo feito homem é Deus verdadeiro, vivo e perfeito, é o Deus de Israel com rosto e coração humanos. Cristo, como aparece hoje no Tabor, já nos mostra a glória que o transfiguraria para sempre. Cristo, envolvendo Moisés e Elias com a sua glória, revela que é nele que a Lei e os profetas encontram a luz e chegam à plenitude. Cristo, inundando de luz a seus discípulos, envolve-os na sua glória, revelando qual o nosso destino: participar da luz da sua glória por toda a eternidade! Mas, tudo isso, passando pelo mistério da cruz!